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domingo, 6 de fevereiro de 2011

Mãe




Oração da Maçaneta
Gióia Júnior

Não há mais bela música que o ruído da maçaneta na porta, quando meu filho volta para casa.Volta da rua, da vasta noite, da madrugada de estranhas vozes, e o ruído da maçaneta, e o gemer do trinco, o bater da porta que novamente se fecha, o tilintar inconfundível do molho de chaves, são um doce acalanto, uma suave cantiga de ninar.
Só assim fecho os olhos, posso, afinal, dormir e descansar. Oh! a longa espera, a negra ausência, as histórias de acidentes e assaltos, que só a noite, como ninguém, sabe contar! Oh! os presságios e os pesadelos, o eco dos passos nas calçadas, a voz dos bêbados na rua, e o longo apito do guarda, medindo a madrugada, e os cães uivando na distância, e o grito alucinante da ambulância! E o coração, descompassado, a pressentir e a martelar na arritmia do relógio do meu quarto, esquadrinhando a noite e seus mistérios; Nisso, na sala que se cala, estala a gargalhada jovem da maçaneta que canta a festiva cantiga do retorno. E sua voz engole a noite imensa, com todos os ruídos secundários. Oh! os címbalos do trinco e os clarins da porta que se escancara, e os guizos das muitas chaves que se abraçam e o festival dos passos que ganham a escada! Nem as vozes da orquestra, e o tilintar dos copos, e a mansa canção da chuva no telhado, podem, sequer, se comparar ao som da maçaneta que sorri, quando meu filho volta. Que ele retorne sempre, são e salvo, marinheiro depois da tempestade, a sorrir e a cantar. E que, na porta, a maçaneta cante a festiva canção do seu retorno, que soa, para mim, como suave cantiga de ninar. Só assim, só assim, meu coração se aquieta, posso, afinal, dormir e descansar.

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